Empresa que não participou de determinada licitação, pode interpor/apresentar recurso?
O presente estudo visa esclarecer quem tem legitimidade, quem é considerado o sujeito ativo para interpor/apresentar recursos em certames licitatórios ou, mais precisamente, o que se pretende analisar, é se a empresa que não participou de determinada licitação, pode interpor/apresentar recurso.
Neste sentido, temos que interposição de recursos, no âmbito das modalidades licitatórias regidas pela Lei 8.666/93, deve observar ao que dispõe o seu art. 109, in verbis:
Art. 109 – Dos atos da Administração decorrentes da aplicação desta Lei cabem:
I – recurso, no prazo de 5 (cinco) dias úteis a contar da intimação do ato ou da lavratura da ata, nos casos de:
- a) habilitação ou inabilitação do licitante;
- b) julgamento das propostas;
- c) anulação ou revogação da licitação;
- d) indeferimento do pedido de inscrição em registro cadastral, sua alteração ou cancelamento;
(…)
- 1º. A intimação dos atos referidos no inciso I, alíneas “a”, “b”, “c” e “e”, deste artigo, excluídos os relativos a advertência e multa de mora, e no inciso III, será feita mediante publicação na imprensa oficial,salvo para os casos previstos nas alíneas “a” e “b”, se presentes os prepostos dos licitantesno ato em que foi adotada a decisão, quando poderá ser feita por comunicação direta aos interessados e lavrada em ata.
(…)
- 3º. Interposto, o recurso será comunicado aos demaislicitantes, que poderão impugná-lo no prazo de 5 (cinco) dias úteis (sem grifos no original).
Considerando isto, é possível afirmar que a interposição de recursos, em face dos atos de julgamento das propostas, habilitação/inabilitação, bem como, anulação/revogação de determinada licitação, será viabilizada tão somente aos licitantes participantes de determinado certame licitatório.
Neste sentido, no que concerne à aludida legitimidade recursal, vejamos os seguintes ensinamentos de Marçal JUSTEN FILHO:
A legitimidade recursal é atribuída àquele que participa da licitação (ou que se encontra em condições de participar dela) ou do contrato administrativo.
O recurso pode ser interposto, em princípio, pelo licitante, quando se tratar de impugnar atos praticados no curso da licitação.
Admite-se que, até cinco dias antes de encerrado o prazo para apresentação da documentação ou das propostas, qualquer interessado possa exercitar a faculdade recursal. Assim, por exemplo, um potencial interessado pode impugnar uma certa cláusula do edital. Se sua impugnação for rejeitada pela comissão de licitação, o particular está legitimado para o recurso.
Também se faculta o recurso ao potencial participante da licitação, afetado por decisão atinente à inscrição própria ou de terceiro no registro cadastral (admissão, alteração ou cancelamento).
Não possui legitimidade para recorrer o terceiro que não participa da licitação ou não está inscrito em registro cadastral. Aquele que deixar decorrer o prazo para apresentar propostas perde legitimidade para interpor recurso. (…) Também carecem de legitimidade recursal os licitantes inabilitados ou desclassificados, relativamente aos eventos posteriores à sua exclusão. Não possuem, ainda, legitimidade recursal os não inscritos em registro cadastral relativamente às decisões correspondentes a tal registro.
Possuem legitimidade recursal, ainda, os contratantes com a Administração Pública, relativamente aos atos que se refiram ao contrato.
Não se admite, contrariamente ao que ocorre no Direito Processual, recurso ao terceiro prejudicado. A condição de terceiro elimina o cabimento do recurso. Se o terceiro for prejudicado, caber-lhe-á exercitar o direito de petição[1] (sem grifos no original).
Acresça-se, ainda, o que leciona Reinaldo Moreira BRUNO: “… legitimidade para interposição – apenas aos licitantes, excluídos os terceiros interessados, a partir do que dispõe o artigo 109, § 3º da Lei n. 8.666/93…”.[2]
Verifica-se, portanto, que os legitimados para apresentar recurso em procedimento licitatório serão: o licitante; o potencial interessado na licitação, que tem sua impugnação rejeitada; o potencial participante afetado por decisão atinente à própria inscrição ou de terceiro; e os Contratantes com a Administração Pública, relativamente aos atos que se refiram ao contrato.
Considerando isto, é possível concluir que uma empresa que não participou de determinado certame licitatório, não poderá se insurgir em face deste pela via recursal/interpor recurso (salvo, adotando-se o entendimento de JUSTEN FILHO, na hipótese de anterior impugnação ao edital desprovida).
Por outro lado, considerando, a uma, o direito constitucional de petição;[3] e, a outra, o dever de autotutela da Administração, as razões do “recurso” “interposto” por empresa que não tiver participado da licitação, estas sim, deverão ser analisadas. Contudo, tal deliberação não se fará como se recurso interposto fosse, mas sim, tais razões serão analisadas na qualidade de manifestação administrativa, com arrimo no já mencionado direito de petição.
Por fim, no que diz respeito especificamente aos certames licitatórios processados por meio de Pregão, há que se considerar o que dispõe o inc. VI, do art. 4º, da Lei 10.520/02, in verbis:
Art. 4º – A fase externa do pregão será iniciada com a convocação dos interessados e observará as seguintes regras:
(…)
VI – no dia, hora e local designados, será realizada sessão pública para recebimento das propostas, devendo o interessado, ou seu representante, identificar-se e, se for o caso, comprovar a existência dos necessários poderes para formulação de propostas e para a prática de todos os demais atos inerentes ao certame (sem grifos no original).
Infere-se, pois, que o credenciamento dos licitantes, em sede de Pregão, constitui-se em condição indispensável, para que os participantes possam “habilitar-se” para a prática de todos os atos inerentes ao certame licitatório, como é exatamente o caso da interposição de recursos.
Por conseguinte, e a título de arremate da presente análise, temos que apenas poderão interpor recursos em face de atos ocorridos ao longo do processo licitatório, instaurado na modalidade Pregão, apenas aqueles licitantes devidamente credenciados; sendo exceção a esta regra, tão somente, a hipótese de licitante não credenciado recorrer, especificamente, em face de seu não credenciamento.
*Larissa Panko é advogada, consultora jurídica no Grupo Negócios Públicos, autora da Obra “Pregão Presencial e Eletrônico – Apontamentos à Legislação Federal” e membro do corpo editorial da revista LICICON.
[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 17. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 1.424.
[2] BRUNO, Reinaldo Moreira. Recursos no Processo Licitatório. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 140.
[3] Constituição da República, art. 5º, inc. LV, in verbis: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Trata-se do consagrado direito de petição assegurado constitucionalmente a todo cidadão.
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